quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Três textos sobre o Corpornô


Texto 01 (Rogers Sousa - Historiador)


Esse fim de semana assisti um espetáculo "Corpornô" da Cia DITA by Fauller Dandi que trás algumas reflexões na forma de pensar o corpo e a relação com a sociedade. Tratar de um tema delicado como é o sexo numa sociedade com bases romana-judaíco-cristã, onde o sexo é algo ainda proibitivo, que se encontra no espaço das alcovas, é mexer como o imaginário das pessoas, incomodá-las, chocá-las mesmo.
A arte é um discurso, e como o mestre Foucault fala, o discurso "é pensado, é planejado", é separado para atingir um objetivo, ou seja, não há ingenuidade nesse discurso, é algo pensado, é algo separado e provocativo. O Corpornô fala de liberdade, de expressões de liberdades humanas, fala daquilo que desejamos falar, de nossas experiências ditas e não ditas, fala de CORPO, de alma e do desejo de sugar a alma. Esse espetáculo não é ingênuo, tem uma finalidade, extremecer paradigmas, pois estamos no século XXI e falar de sexo é algo que nos faz rir, gracejos, proibido? Falar sobre sexo, não falo de sexualidade, sexo é um SEGREDO, numa sociedade puritana, que se reconhece pessoa de fé, temos a percepção de que somos seres que buscamos o prazer, o prazer....O PRAZER DOS "ANORMAIS", socialmente, quem expressa seu prazer, seja ele de que forma... Ou é anormal? (de novo Foucault)...Esse espetáculo é uma expressão do desejo de desejar....Será visto por muitas pessoas, e cada uma terá sua reação, sobretudo uma reação que me incomodou..."Há, por que não tem homens heteros no conjunto?" - ainda somos limitados quando se fala de sexo, não acredito que nossa sociedade o trata como algo normal, apesar de ser natural....Concluo minnhas idéias com a seguinte senteça: "SÓ ME DIRIJO ÀS PESSOAS CAPAZES DE ME ENTENDER, E ESSAS PODERÃO LER-ME SEM PERIGO". Marquês de SADE......



Texto 02 (Victor Hugo - Ator)

Não se tornou banal. Transar é uma coisa natural, como comer, cagar, peidar. É um impulso orgânico dotado de instinto. Fome é instinto, sono é instinto, tesão é instinto. Não creio que seja por termos a noção de perpetuação da espécie. Nosso corpo pede, é somente o prazer sexual. Tinha uma tia que me dizia, que temos que trepar, senão o ovo pesa, dói. Sem localizar a angústia do não sexo nos ovos, abramos para o corpo todo. Sexo é uma necessidade, gozar é uma necessidade. Sentir a pele do(s) outro(s) é necessidade.
A primeira frase que coloco é com relação ao que a Silvia Moura disse. Em nenhum momento achei banal ou vazio. Depois dos depoimentos de cada um, a primeira cena mostra um homem e uma mulher com um conjunto indumentário que me remeteu a uma condição econômica e social boa. Ele chega com o pão, em toda família acontece isso, alguém compra as coisas para a casa, era uma família normal. Até que ela derruba o homem, ensaca a sua cabeça com o saco de pão e cai de cara em seu rabo. Ali, é como se ela estivesse dominando ele. Mas não quero focar nessa relação de dominação, ou fetichista, ou o que quer que seja. Para mim, ficou claro que todos nós somos capazes de ter a nossa sexualidade da forma que bem entendermos.
O que se seguiu foi consequência deste pensamento[1], aí reside a minha discordância da Silvia, há diferença entre banal e natural.
Banal:
adj. Sem originalidade: elogios banais.
Comum, trivial, vulgar, chato.
Natural:
adj. Que se refere ou pertence à natureza.
Produzido pela natureza ou de acordo com suas leis.
Espontâneo, simples, desafetado.
s.m. e s.f. Habitante ou originário de um lugar; indígena (mais usado no plural).
S.m. Caráter, índole, inclinações de uma pessoa: o natural do homem.
loc. adv. Ao natural, conforme à natureza, à realidade, ao original: pintar alguém ao natural; sem tempero, sem preparo, servido sozinho: peixe ao natural.”

Lembro-me de um incomodo que tenho desde a adolescência. As pessoas tem uma necessidade de mostrar um puritanismo[2], muitas vezes hipócrita. Então, se sexo é uma coisa natural, do ser humano, por que tratá-lo como um demônio particular?  Talvez a Igreja Católica nos ajude a responder por que nesses, aproximadamente, 1800 de sua existência fomos obrigados a colocar a nossa sexualidade dentro de um saco de pão. Que no dia seguinte já está duro, seco e só presta para fazer torrada.



[1] Falo com relação a minha percepção, não sei se é necessário lembrar, mas o que estiver contido aqui é relacionado à mim, como se passou para mim.
[2] Refiro-me à todo comportamento controlado por algo ou alguém, mesmo que não saibamos o que ou quem.




Texto 03 (João Paulo Pinho - Ator)


Não é a pornografia que é obscena, é a fome que é obscena.
José Saramago

Deixarei de lado a badalada discussão sobre a diferença entre o erótico e o pornográfico, tão comentada durante a conversa ao final do espetáculo Corponô. Acredito que deter-me a isso seria tornar raso o universo trabalhado pela Cia Dita no experimento apresentado, restringindo o debate apenas para a questão da linguagem. E o nosso universo (como o do espetáculo) vai além do que exprime a linguagem, adentra o campo do inefável.

Corpornô traz para a cena o que trazemos no corpo desde muito cedo, o prazer sexual. Freud foi quem quebrou o mito da “infância inocente” ao estudar o prazer sexual em crianças. A teoria da sexualidade, segundo Freud, justificaria grande parte de nossos traumas e conflitos da fase adulta. O modo repressor como a sociedade, ao longo de sua história, vem tratando o tema revela o quanto ainda temos para evoluir na questão. Transpor para o palco essa problemática é sem dúvida um desafio grandioso, seja no campo do pudor social em relação ao tema, seja no campo da investigação pessoal de cada artista do trabalho, que expõe não só seu porco erótico, mais a fragilidade de toda a sociedade.

O espetáculo, que encontra-se em processo de construção, já nos revela um pouco do olhar do coreógrafo e diretor Fauller sobre o tema. O erótico e/ou pornográfico estão em função arte. A plasticidade dos corpos nus, as formas e imagens criadas transportam o espectador para o campo do desconforto. É possível assistir ao espetáculo e perceber o tema não só na postura solta e desenvolta dos bailarinos. Corpornô é também o corpo retraído do espectador que se retorce na cadeira com seu desejo incontrolável de expressar prazer. O espetáculo cede espaço para a intervenção. O corpo deseja. A mente julga.


3 comentários:

  1. Fauller, você não teria o Corpornô em vídeo, teria? Assisti ele hoje no SESC daqui de Juazeiro, e gostaria de mostrar a alguém. Agradeço desde já a atenção.

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  2. Ou melhor, quando será a próxima apresentação, e onde??

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