quarta-feira, 3 de novembro de 2010

INC. (Fauller responde coreógrafa cearense)

Em janeiro de 2010, a Cia. Dita retomou um projeto criado em 2005.
INC. voltou aos palcos cearenses quase que irreconhecivel.
Repensado, destruído e reconstruído o trabalho coloca na linha de fogo Fauller e Wilemara Barros,
de um lado os admiradores do espetáculo, levemente incomodados com todas as mudanças, do outro o público que ainda não o conhecia, público este que teceu ótimas críticas, mesmo classificando a obra como "dura" ou "pesada".

Seguem fotos e entrevista para Maurilene Moreira (performer, coreógrafa e pessoa da dança do Ceará).


Olá Fauller e Wila,
Olá Cia. DITA...

Estive a assisti-los e confesso que até agora para que eu possa me desbravar a escrita precisaria de umas perguntinhas básicas.
Eu assisti o INC. na época em que ele ficou em cartaz no QUINTA COM DANÇA, alguns anos atrás, se vocês puderem me recordar agradeço...
As impressões obtidas foram totalmente distintas...

1-Certo que estamos em tempos outros... Mas fico me perguntando onde está aquela obra antes vista por mim?

Rsrs, é penso constantemente nisso, como manter a obra viva, e ainda assim deixá-la ser o que ela é, mesmo com tantas modificações...não sei não quero ter essa responsabilidade de falar onde a obra está, ou onde ela pode ir, a obra por si fala quando chega a cena já deixa esses indícios, gosto de deixar algo aberto para que o público também tenha propriedade sobre que o ver.

2-Será que eu cresci e os meus olhos cresceram junto comigo, ou será que são duas obras que tem semelhanças, mas que se diferem?!

Bem, primeiro você cresceu e os seus olhos amadureceram juntos, penso eu, depois não acredito que sejam duas obras, rsrsrs, foi só a forma de como lido com a estrutura da coisa que mudou, mas o assunto, a idéia central do trabalho ainda está lá.

3-Por que duas imagens de sexos opostos com os mesmos saltos altos, com a mesma perna enfaixada, com o mesmo reflexo quando dantes existia uma oposição?

Eu não penso nisso, embora saiba que isso é um símbolo muito importante, quase chega a ser uma questão de gênero, mas quando me coloco também na mesma situação que a Wilemara Barros, apenas estou lidando com a criação de uma imagem, que começa em mim, e se concretiza nela. Essa cena vou ter que amadurecer melhor, essas apresentações foram um bom recomeço de estudo.

4-Será que existia aquele tempo de respiração que se decaía, entrando em decomposição de imagens nos primeiros minutos da cena? 

Não, não existia, mas eu estava muito insatisfeito com o inicio do trabalho, me parecia bastante ingênuo, e agora eu acho que o trabalho tem o peso que deveria ter desde sempre,
acabou o humor...quero algo duro e pesado, como a vida as vezes é.
Acho bom o público saber que tem que pensar, se quiser rir é só ir aos shows da Débora Colker.

5-Por que os ventos de prazer delirantes da coca-cola naquela seqüência que parecia infantil desapareceram?
Não, se transformaram em outra coisa.

A minha resposta anterior responde essa pergunta.

6- E aquele beijo, a sensação de casal de um tempo que ainda virá...
Um devir humanidade, seria? Por que das mudanças? O que mobilizou em vocês a necessidade de chegar ao INC. que ele é hoje?

É, também já respondi, precisava dar o peso que o trabalho pede. Agora posso apresentá-lo em qualquer lugar do mundo, sem temer ser ingênuo. Aqui a ingenuidade não cabe.

*Eu poderia ter escrito sobre estas minhas relações do que ele era antes e do que ele é hoje... Mas preciso me recordar daquele túnel do final em que você, a figura do homem, dançava de encontro à luz e ela, a figura feminina ia ao encontro da luz... Um aparentemente encontrado em seu espaço de atuação (a figura masculina) e a outra encontrada despida, com seus passos rígidos e seu glamour dos sapatinhos vermelhos?

Procuro palavras para a estética do seu trabalho...

7-Há o que clarear?! 

Eu não sei, gosto muito do que torna a percepção do público obscura, rsrsrs, aprendi que o artista não é sempre aquele que explica, mas o que faz perguntas, coloca suas questões, e quem sabe possa apontar alguma saída.
Mas posso dizer apenas que ouve um tempo em que achei que esse trabalho teria um prazo de validade muito curto, mas o tempo está passando, eu estou amadurecendo enquanto artista, e criando outras peças, então vou apresentá-lo e modificá-lo sempre que sentir que haja necessidade, nesse sentido vou dar ao público somente o que eu quero que ele tenha de mim, e espero ser generoso, mas sobretudo honesto comigo mesmo.




*Aqui vão algumas perguntinhas norteadoras...
PS. Tenho admiração pelos trabalhos vossos!

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